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A deficiência não está na pessoa, mas na escada”, diz Defensor Público

Defensor  Público  explica  a  obrigatoriedade  legal  da  acessibilidade  qualificada  nos  morros  e  reforça  que  a  omissão  do  poder  público  é  um  “obstáculo  social”  passível  de responsabilização

Matéria: Nicoly Reis

Lei matéria: A  barreira  urbana  que  transforma  morros  em  ilhas  de  Direitos  negados 

A  crise  de  acessibilidade  que  isola  as  comunidades  do  Território  do  Bem  é,  para  a  Justiça,  uma  violação  direta  de  Direitos  constitucionais.  O  defensor  público  ouvido  pela  reportagem  é  direto:  a  ausência  de  rampas,  corrimãos,  pisos  adequados  e  outras  condições  mínimas  não  é  falha  de  engenharia,  mas  uma  afronta  à  dignidade  da pessoa humana.

E  o  ponto  de  partida  dessa  discussão  é  o  conceito  legal  de  deficiência.  Segundo  o  defensor,  a  legislação  brasileira  não  considera  mais  a  deficiência  como  uma  característica  individual,  mas  como  um  obstáculo  social  ou  físico  produzido  pelo  meio,  capaz  de  impedir  que  a  pessoa  acesse  um  serviço  ou  espaço.  “Se  você  tem  um  lugar  completamente  acessível,  essa  pessoa  não  tem  obstáculo.  Não  existe  o  conceito de deficiência naquele ambiente”, explica.

Esse  entendimento,  previsto  na  Convenção  Internacional  sobre  os  Direitos  da  Pessoa  com  Deficiência  e  na  Lei  Brasileira  de  Inclusão,   transforma  a  acessibilidade  em  um  Direito  fundamental  e  também  em  um  meio  para  outros  Direitos.  Quando  um  idoso  deixa  de  acessar  um  posto  de  saúde  por  causa  de  uma  escadaria  insegura,  há  violação  do  direito  à  saúde.  Quando  uma  mãe  não  consegue  chegar  à  Defensoria, fere-se o acesso à Justiça.

Acessibilidade: o que a lei realmente exige?

Grande  parte  das  escadarias  do  Território  se  encontram  com  falhas  e  buracos  em  degraus,  segundo moradores.. 

Foto: Juliana Indami

A  legislação  brasileira  não  aceita  soluções  improvisadas.  O  defensor  afirma  que  não  basta  construir  qualquer  rampa.  A  lei  exige  a  chamada  acessibilidade  qualificada,  que garanta autonomia e segurança sem que a pessoa dependa de terceiros.

Esse  padrão  se  fundamenta  no  Desenho  Universal,  conceito  que  orienta  a  construção  de  espaços  capazes  de  atender  o  maior  número  possível  de  pessoas,  crianças,  idosos,  pessoas  com  mobilidade  reduzida,  pessoas  com  deficiência  permanente ou temporária.

Entre os elementos essenciais estão:

  • Rampas com angulação correta, seguindo normas da ABNT;
  • Corrimãos, importantes mesmo quando não suprem todas as necessidades;
  • Pisos antiderrapantes;
  • Elevadores ou  plataformas  nos  casos  em  que  o  terreno  impede  a  rampa  adequada,  como  já  ocorre  em  metrôs  e  equipamentos  urbanos  de  outras

O  defensor  reforça  que  o  poder  público  não  pode  “maquiar  as  barreiras”  –  por  exemplo,  deslocar  serviços  para  a  parte  baixa  do  morro  esperando  que  a  população  desça.  Isso  não  elimina  o  obstáculo,  apenas  o  desloca,  aprofundando  desigualdades.

Omissão também é violação: o Estado responde

No  Brasil,  o  poder  público  possui  Responsabilidade  Objetiva.  Isso  significa  que  o  município  pode  ser  responsabilizado  pela  simples  omissão,  independentemente  de  intenção.  “A  mera  violação  de  um  direito  fundamental  já  gera  responsabilidade  do  Estado”, esclareceu o especialista.

Além  disso,  aaaa  explica  que  o  governo  não  pode  alegar  falta  de  recursos,  o  chamado  princípio  da  reserva  do  possível,  para  negar  direitos  constitucionais  como  saúde, educação e dignidade humana.

 Como o cidadão pode exigir o Direito?

Moradores e associações podem agir em duas frentes:

  • . Via Administrativa – Direito de Petição

Garantido  pelo  Artigo  5º  da  Constituição,  permite  que  qualquer  cidadão  protocole  um  pedido  formal  na  Prefeitura.  O  defensor  orienta  que  o  documento  seja  acompanhado de:

  • Fotografias das escadarias e obstáculos;
  • Laudos médicos de idosos e pessoas com mobilidade reduzida;
  • Relatórios de agentes comunitários de saúde;
  • Declarações de moradores com identificação e data.

Esse protocolo abre um processo administrativo que deve ser acompanhado.

  • Via Judicial – Atuação da Defensoria Pública

A Defensoria pode agir de três formas:

  • Recomendação Administrativa:  documento  que  alerta  o  poder  público  sobre  a  violação e solicita correção imediata;
  • Termo de  Ajustamento  de  Conduta  (TAC):  acordo  com  prazos  e  metas  para  execução das obras;
  • Ação Civil  Pública  (ACP):  quando  não  há  solução  administrativa,  a  Defensoria  pode  entrar  com  ação  coletiva  em  nome  de  toda  a  comunidade,  sem que cada morador precise dar procuração.

A  instituição  atua  como  “fiscal  dos  vulneráveis”,  explica  o  defensor,  e  tem  capacidade  jurídica  para  defender  idosos,  crianças,  pessoas  com  deficiência  e  todos  os que enfrentam barreiras estruturais nos morros.

Calango Notícias

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