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Da invisibilidade ao protagonismo: a comunidade do Jaburu como berço do empreendedorismo

*Texto: Daiane Obolari, José Modenesi, Kamily Rodrigues e Paulo Victor Barcellos

Quando se fala em Território do Bem, o que vem à sua mente? As comunidades que fazem parte, em especial o Jaburu, que vamos conhecer agora, tem muito a nos ensinar. Chegou a hora de resgatar boas memórias e construir novas! Por isso, te convidamos a mergulhar nas histórias a seguir.

Realizar sonhos e incentivar os moradores da comunidade a irem atrás de seus objetivos. Essas são algumas das tantas atribuições de Sebastião Luiz Castro, presidente da Associação de Moradores do Jaburu. Residente do bairro desde os 14 anos, ele é um dos responsáveis por ajudar a levar melhorias habitacionais e estruturais ao bairro.

Sebastião Luiz, presidente da Associação de Moradores do Jaburu. Foto: José Modenesi

“Como presidente da Associação, além de buscar melhorias habitacionais, lazer, saúde e educação, a gente atende casos pessoais. Se tem uma família passando dificuldade precisando de uma cesta básica, a gente busca ajuda. Quando alguém fica sem luz, a gente vai até o local pegar o número da lâmpada e um ponto de referência, para que o técnico consiga encontrar e assim nós somos demandados”, explica.

O que é feito hoje pela Associação, é reflexo do que começou há 76 anos. Antônio Leal foi o primeiro presidente do Jaburu e fala sobre o assunto com muito orgulho. “A prosperidade da comunidade começou em 1947, quando eu vim morar no manguezal. Daqui fiz o rascunho do que veio a ser o primeiro mapa da comunidade. Em 1950, Getúlio Vargas veio aqui e a prefeitura o biografou. Criei também o Conselho de Ética e hoje temos uma comunidade boa e bem-sucedida. Quando inteirou 58 anos de mandato, eu deixei a presidência”, conta.

Com toda a estrutura deixada, o Jaburu se tornou um bairro que se importa com o bem-estar da comunidade, que valoriza o sentimento de pertencimento e que cultiva, no coração dos moradores, o amor pela vizinhança e pelo local.

À esquerda, Sebastião Luiz, atual presidente da Associação de Moradores do Jaburu. À direita, Antônio Leal, primeiro presidente da Associação. Foto: José Modenesi

A comunidade como segunda família

Todo o trabalho realizado pela Associação de Moradores ao longo dos anos, reflete na comunidade até os dias de hoje. Um exemplo é Alci da Penha, comerciante local que descreve com brilho nos olhos como é bom pertencer ao bairro Jaburu.

“Aqui eu me sinto em casa, é a minha segunda família, tenho muitas amizades boas. É um ajudando o outro, é muito bom”, destaca.

O comerciante, que cria os filhos mais novos com o esforço do seu trabalho, já teve uma quitanda de hortifrúti e, atualmente, é proprietário de um bar no Jaburu. Ele conta que abriu o próprio negócio após a empresa que ele trabalhava como porteiro fechar no Espírito Santo. Alci até foi convidado para permanecer na empresa, trabalhando em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, mas o amor pelos filhos e pela família falou mais alto.

Alci da Penha ao lado de seu filho Dhiogo. Foto: José Modenesi

“Não fui pela minha família. Tudo que eu faço é pensando nos meus filhos, o que eu ganho aqui, vai para dentro de casa. O filho é a base de tudo, é a força da gente, tenho que pensar no futuro deles”, afirma emocionado.

A paixão pelo bairro é tanta, que ao falar do Jaburu, Alci faz questão de destacar que se mudar não está nos seus planos e que deseja partilhar o pouco que tem com os amigos e vizinhos.

Uma história de superação

Para além de tudo o que já contamos, nunca é demais falar sobre o quanto o Território do Bem tem moradores que lutam dia a dia por um futuro melhor.

Chegou a hora de conhecermos Maria Julia Rodrigues, que já foi vendedora ambulante e hoje é proprietária da “Padaria e Lanchonete Depois do Culto”, também localizada no Jaburu.

Maria Julia, proprietária da “Padaria e Lanchonete Depois do Culto”.Foto: José Modenesi

Bem-humorada, ela faz questão de explicar o motivo de ter escolhido esse nome para o empreendimento. “Quando saem das missas e dos cultos, os irmãos e os católicos vêm para cá lanchar. Por isso dei esse nome”, esclarece

Com o crescimento da lanchonete, atualmente Maria Julia conta com o apoio de duas funcionárias e de sua filha, mas nem sempre foi assim. Ela relata que pelo fato de ser uma mulher negra, já perdeu muitas vendas quando ainda atuava como vendedora ambulante de cachorro-quente.

“Nem todo mundo vinha na barraquinha comprar porque a maioria tinha preconceito com a minha cor. Já ouvi dizerem que não era para comprar comigo porque ‘se é preta deve ser porca’. Tive vontade de desistir, mas segui em frente pela minha filha, ela é a maior inspiração da minha vida, a realização de um sonho.”

E, com alto-astral, ela deixa uma mensagem que gostaria de dizer para os amigos da comunidade. “Não desista, a sua persistência pode te levar a lugares que você nunca imaginou”, pontua.

Periferia: uma potência empreendedora

Histórias de sucesso como a de Alci da Penha e Maria Julia Rodrigues, não são casos isolados. Uma pesquisa realizada pelo Data Favela, aponta que comunidades periféricas são berços de oportunidades econômicas.

Isso porque, no Brasil, 50% dos moradores de comunidades possuem o próprio negócio. Além disso, quando o assunto é potencial de consumo, as favelas atingem a marca de quase R$ 10 bilhões por ano em diversos setores.

Para o líder comunitário Cosme Santos, essa potência empreendedora é muito importante para o desenvolvimento econômico local. “Uma comunidade que tem um comércio forte, gera renda ao contratar funcionários, além de promover uma qualidade de vida melhor para os moradores”, explica.

Vista do alto da comunidade de Jaburu. Foto: José Modenesi

Circuito Verde e Núcleo de Memórias

Se você chegou até aqui e gostaria de visitar o Jaburu, temos uma boa notícia. Você pode conferir o Circuito Verde! Por lá você encontra hortas coletivas e jardins que são mantidos pelos próprios moradores.

> VEJA MAIS: “Circuito Verde Jaburu” – Horta comunitária nas favelas de Vitória

Criado no início deste ano, o projeto começa no Mirante do Jaburu e finaliza no Núcleo de Memória de Jaburu (NUME). Inaugurado em 2022, o NUME conta a história do bairro do Jaburu, por meio de fotos e vídeos com depoimentos dos moradores mais antigos do bairro. “O NUME veio para resgatar a grande história da fundação da comunidade”, destaca Sebastião Luiz, presidente da Associação de Moradores do Jaburu.

Núcleo de Memória de Jaburu (NUME). Foto: José Modenesi

O objetivo do Núcleo de Memórias é resgatar os pontos fortes da comunidade do Jaburu, para que ela passe a ser enxergada por outros olhos, que não sejam de violência, mas sim de um lugar próspero, que é polo de empreendedorismo e de união.

Para conhecer o circuito, basta agendar a visita pelo Instagram @circuitoverdejaburu.

Confira a reportagem em áudio

*Daiane Obolari, José Modenesi, Kamily Rodrigues e Paulo Victor Barcellos são alunos do curso de Jornalismo da Faesa, sob supervisão da professora de Projeto Integrador V (2023/2), Lara Rosado.

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